APEGO... O QUE É, O QUE FAZ, O QUE PROVOCA...

 p. Daniel H Della Valle Cauci

Todos somos apegados a alguma coisa, a alguma memória, a alguma pessoa ou talvez a algum bichinho, a alguma mascote. É comum e normal nos primeiros anos de vida, que estes apegos até sejam muitos, pois eles são criados desde os primeiros meses, por uma questão da impostergável satisfação das nossas necessidades.

Porém, com o pasar dos anos e com a chegada da vida adulta, muitas dessas necessidades são auto satisfeitas e nós vamos tornando... digamos que... mais independentes.

No entanto, algumas pessoas mais que outras, estabelecem ligações emocionais com elementos do seu entorno, e, na prática, focam sua atenção e seu interesse nesses elementos, que são em geral, menos essenciais.

Para o dicionário, apego é “dedicação constante e excessiva a algo” e também “ligação afetuosa; afeição ou estima.”

Muitas vezes pode se tratar de um apego aparentemente inofensivo, ao qual nos referimos corriqueiramente: Apego aos filhos ou apego destes aos pais, apego a uma certa rotina, a uma camisa, apego a um canto da casa... apego nostálgico ás lembranças...

Em tanto não prestemos atenção a toda a extensão do significado da palavra, ter apego até parece ser normal e ser parte da nossa humanidade. É sim parte da nossa humanidade imperfeita, e não necessariamente a consideramos fora do normal.

Também significa por exemplo, Segurar-se a, agarrar-se, afeiçoar-se, recorrer a, pôr-se sob a proteção de, valer-se de, e até manter proximidade de outro indivíduo considerado capaz de nos satisfazer alguma das nossas necessidades, mesmo sendo ou não essenciais.

Porém, em algumas das possíveis acepções da palavra “apego”, achamos referência a vínculos que em algum momento deixam de ser equilibrados ou sadios.

Numa destas acepções, dentro de um contexto estrito e de profundo significado como é o contexto do Taoismo, no livro “Tratado da união oculta” o apego se define como uma não-virtude, e também como uma das primeiras limitações que o homem possui para sua emancipação da dualidade. Isto, segundo o livro “Tao te Ching” de Lao Tsé.

Segundo o “Tratado da união oculta, o apego, como uma não-virtude, gera mais não-virtudes que agem na nossa consciência, consumindo a nossa energia vital.

O apego é um sentimento ou emoção, um estado de ânimo que nos conduz à cristalização de energias e de conceitos, à imobilização, pois nos enraíza numa postura de dependência a coisas, sentimentos, pessoas e até a padrões de comportamento. Nos conduz a uma dependência de aquilo pelo que sentimos apego, que enceguece e nos desvia do realmente essencial, ou seja, que de certa forma nos extrai de nós mesmos.

Desde a psicologia, ouvimos que o apego pode ser a coisas, sentimentos, comportamentos, se denominando de diferentes maneiras. Mas, a psicologia observa muito ao apego às pessoas dentro dos relacionamentos interpessoais.

Segundo a teoria do apego da psicologia, se sugere que os seres humanos têm uma necessidade inata de estabelecer vínculos emocionais saudáveis desde a infância. Esses vínculos afetam a maneira como percebemos e interpretamos o mundo ao nosso redor, e a falta de afetos, ou de “afagos”, que é um conceito mais amplo, proveniente do Análise Transacional de Eric Berne, será determinante para a existência de problemas no desenvolvimento na idade adulta.

Porém, para que exista apego, a forma em que o indivíduo se relaciona com a realidade, perde necessariamente parte da sua dinâmica. Experimentar a realidade mantendo apegos gera laços emocionais e afetivos mais ou menos fixos, estabelecendo uma relação de dependência com o objeto do apego, seja com coisas, sentimentos, comportamentos ou outros seres.

O vínculo, através de apego, é mais enrijecido, não dinâmico, muitas vezes saindo-se do que pode ser considerado normal, sendo que a realidade é indefectivelmente cambiante. No entanto, essa forma apegada de relacionamento, nos traz uma sensação de estabilidade que muitas vezes achamos necessária, que ansiamos ou desejamos.

Este tipo de relação cristalizada, nos outorga uma sensação de segurança, de estarmos mais completos e até potencializa a nossa autoestima, o que sugere que esse tipo de sentimento, vem a reforçar nossa personalidade e a completá-la nos seus aspectos mais deficientes, só que de uma forma superficial e inadequada.

Assim, essa forma específica de nos relacionar com o objeto do nosso apego, não permite o equilíbrio subjetivo que é exigida por uma boa adaptação à realidade. O apego supõe tensão; exige a expectativa de que essa inter-relação tenha que acontecer de uma determinada maneira.

Nos fixar ou condicionar a algo pelo qual sentimos apego, é de certa forma imobilizar uma parte de nós, é ficar atrelados a algo fora de nós, limita a nossa autonomia, atrapalha nosso crescimento, gera estresse e ansiedade, e, independentemente de já vivermos na ilusão, o apego gera ainda uma ilusão ainda mais restrita...

O apego pode bem existir e ser até necessário nos primeiros anos de vida, mas, se torna um pesado lastre no adulto que faz seu próprio análise e toma suas próprias decisões. Inclusive, há quem considera que “um pouco” de apego não faz mal e faz parte de nossa humanidade. No entanto, ao analisar em profundidade o que significa o apego na nossa vida, seja nos aspectos físicos ou psíquico-emocionais, descobrimos que seu tamanho ou sua intensidade está diretamente relacionado com o deterioro da capacidade de direcionar a nossa vida, sem gerar consequências negativas.

O apego gera emoções que saem do seu leito, gerando impulsividade e incapacidade da condução equilibrada na nossa vida.

Por essas razões e outras, o apego pesa e influencia de mais na percepção do universo que nos rodeia, o que será determinante para uma correta compreensão da vida e dos seus desafios, e pelas escolhas e decisões que a cada passo tenhamos que assumir.

Em definitivas, o apego nos limita enormemente.

Podemos agregar, que o apego é uma das principais razões para deixar de acreditar naquilo que a realidade nos assinala como verdadeiro, para acreditar naquilo que melhor se ajusta ao que necessitamos acreditar, nos conduzindo de olhos abertos a frustração e ao fracasso. Sem dúvidas, uma forma rápida de cegueira perceptiva, que nos leva direto ao equivoco e à ineficiência relacional.

Dentro de um análise sistêmico, o apego solidifica a indispensável flexibilidade e a capacidade de adequação que todos devemos ter, para bem conduzir a vida através dos acertos e as boas decisões, ou, através da necessária ponderação e revisão constante, consciente e sincera, das ações que possam ter provocado consequências negativas na nossa caminhada.

O apego se expressa sistemicamente em todas as formas de relacionamento humano, como um laço ou vínculo enrijecido em base a sentimentos ultrapassados ou sistemas de crença que perderam seu sentido. Pode se ver em algumas dinâmicas relacionais dentre mães e filhos, no ciúme dentro de uma relação matrimonial, ou na incapacidade de mudar hábitos ou mesmo se adaptar a novas rotinas.

Um sistema de crenças persiste através do apego. Ideias limitantes são apegos. A dinâmicas de Eu por você ou de Eu com você, são formas de apegos. As múltiplas chantagens emocionais que acontecem dentro da família, a inflexibilidade que nos impede de reconhecer onde está o nosso equívoco, a incapacidade de reconhecer a razão na opinião do outro, todas estas são formas em que, o apego a estruturas de pensamentos e sentimentos, se expressam na nossa inter-relação familiar ou social, impedindo a necessária capacidade de autocrítica e de autopercepção para um melhor e correto agir sistêmico.    

Falar de apego não é outra coisa que dar nome a nossos próprios limites. Uma forma de compreender a que ponto estamos limitados pela razão e pela nossa própria estruturação psíquica.

Apesar de que nos primeiros anos de vida devemos ao apego e à resposta positiva das pessoas às quais nos apegamos, o fato de crescermos em equilíbrio, com segurança e autoestima, no comando das ferramentas imprescindíveis para o êxito na nossa vida em sociedade, será na nossa vida de adultos responsáveis, que comprovaremos se temos ou não a capacidade de fluir na vida sem cair nas armadilhas da soberba, da empatia, da boa ou má consciência assim como de outras dicotomias conceituais, como aquelas que surgem do sentimento do apego.

Criar vínculos afetivos sim. Apegos não

Relacionarmos com o entorno e com as coisas de forma equilibrada e satisfatória, sim. Apegos não. 

Pertencer a nosso sistema acontece através de vínculos que, para ser efetivos, em nenhum momento cristalizam. Apegos em todo caso enfraquecem. Não fazem parte do fluir do adulto nas ondas da vida.

 

Um enorme abraço a todos,

Muita luz

Até breve!


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