A EXCLUSÃO: Uma ação impensada com consequências sistêmicas negativas.

p. Daniel H Della Valle Cauci


Vamos parar um momento para refletir sobre nossas experiências de vida. 

Quantas vezes já afastamos pessoas de nosso convívio? Quantas vezes as excluímos? 

Seja por discordâncias, mal-entendidos ou até teimosia? 


Já vimos pessoas cortando relações com irmãos, parentes ou amigos por causa de desentendimentos que aparentemente não possuem uma solução. Isso nos leva a questionar: será que essa exclusão é a melhor saída? 

Ou melhor:

Será que é uma saída?


Pense nas vezes em que nos afastamos de pais, mães ou familiares por não terem atendido às nossas expectativas. 

Quantas vezes excluímos alguém de nossas vidas, seja qual for o motivo? 


A exclusão é uma ação drástica, que procura privar algo ou alguém da sua existência; que decide pela sua omissão, porém, devido à natureza dos relacionamentos dentro do sistema familiar, ousamos passar por cima de laços emocionais, relacionais, genéticos e sociais, impossíveis de apagar, impossíveis de excluir, e essa ação impensada, trará consequências.


Friamente, excluir segundo o dicionário, é afastar, separar, deixar de lado, omitir… 


Mas, temos que mencionar, que existem elementos, fatos, pensamentos e ações que não podem ser simplesmente excluídos. 

Muito menos pessoas, pois negar seu direito de ser, de pensar e suas peculiaridades, é uma ação impossível que só se poderia ocorrer em um mundo ilusório. 


Podemos nos afastar de pessoas com quem não nos identificamos, mas isso não precisa significar excluir. Podemos escolher nos distanciar sem negar a essas pessoas o direito de serem quem são.


No entanto, as vezes chegamos a dizer… “Eu não tenho pai” … ou “Eu não tenho irmão”, à sombra de uma grande dor ou de uma grande intransigência.


Excluir alguém, em alguns casos, é apenas deixá-lo de lado. Mas a ação de excluir, muitas vezes impensada ou feita no calor do momento, cristaliza em nós, como um movimento profundo e definitivo. Neste caso, a exclusão significa retirar-lhe o direito de pertencer a um grupo, seja uma família, empresa ou comunidade. 


No entanto, essa pretendida exclusão não é simples, não é prática nem é eficiente como parece. Temos que perceber que há coisas e pessoas que não podem ser eliminadas como palavras de um texto. 


A exclusão é como uma pedra jogada em um lago tranquilo. As ondas provocadas se espalham e afetam tudo à sua volta.


É claro que algumas ações e comportamentos necessitam de limites. Os limites que a vida em comunidade determina e as leis dos homens estabelecem, e quem falta ou transgride estas leis, deverá enfrentar suas consequências. 


Mas, sistemicamente, excluir pessoas dos seus sistemas de pertencimento, é uma aventura sem final feliz. 

Um sistema de pertencimento, como é a família, possui indivíduos que se unem por forças e laços, afinidades e co sanguinidade, e integram uma estrutura baseada na confiança, no suporte mutuo, nos sentimentos, e muitas outras coisas.  


Juntos buscam realização e crescimento. A soma das suas partes (indivíduos) gera algo diferente (a família). A retirada de uma das suas partes, gerará algo diferente a aquela família. Se se exclui um dos indivíduos, tudo se modifica, inclusive o que se denomina “características emergentes de um sistema”, que seriam os resultados da interação dos indivíduos, como crescimento, evolução, bem estar, bens materiais, etc.


Fica claro então, que nesta reflexão não nos estamos referindo a qualquer tipo exclusão. Nos referimos à exclusão sistêmica, que resulta da privação do direto de pertencer, de ser parte do grupo de indivíduos que conformam um sistema, seja qual for a forma de exclusão. 


Dentro da visão sistêmica, este tipo de exclusão terá como consequências modificações no sistema. Os excluídos além de ser insubstituíveis, são necessários. Só ele, quem foi excluído, pode, ao ser reincluído, resolver o problema que gerou sua exclusão. 


Se em um sistema familiar em equilíbrio, um dos indivíduos, por qualquer motivo, é excluído, o sistema se modificará, gerando dinâmicas que procurarão o reequilíbrio, à luz da necessidade de ajustes nem sempre fácies ou possíveis, em uma repetição de padrões à espera de soluções para todo o sistema, tomando a serviço para esse fim, inclusive a outros integrantes da família.


A exclusão é uma falta ou transgressão às leis sistêmicas, segundo Bert Hellinger, e gera o que se denomina um “emaranhamento”, uma espécie de turbulência na rede de relacionamentos que afeta de diferentes formas e graus ao sistema e a seus integrantes, muito mais facilmente observáveis na prática que no nosso relato. 


Estes emaranhamentos ou conflitos trarão consequências negativas para a saúde e equilíbrio do sistema, que poderão vir a se expressar nos indivíduos física, emocional e comportamentalmente, prejudicando-os ou até chegar à possibilidade de tornar inviável ao próprio sistema.


Quando alguém, dentro do sistema deixa de respeitar estas leis, surge uma desordem e um desequilíbrio, que o próprio sistema se obriga a reverter. E não se trata de um equilíbrio místico, mantido pôr interações espirituais e esotéricas desencaixadas do obvio e do explicável. Tudo se explica através das características e princípios dos sistemas dentro da Teoria Geral dos Sistemas.

  


Um sistema complexo como é a família, possui uma poderosa força de manutenção que surge das suas características, como o são a auto-organização, a resiliência e a adaptabilidade (dentre outras). Em tanto que dentro da teoria de Bert Hellinguer, essa força se expressa pela vigilante ação da consciência familiar ou consciência grupal, onde justamente agem estas leis sistêmicas, a favor do reequilíbrio, que em este caso seria a reinclusão.


A exclusão gerará tensões, emoções, sentimentos e respostas orgânicas. Tudo o que negamos, carregamos, e isto se refere ao fato de que quando negamos ou reprimimos aspectos de nós mesmos, emoções, experiências .... ou pessoas e suas realidades, essas negações podem ter e terão um impacto psicologicamente significativo em nossa vida…

Isto, é o que nos diz a psicologia.


Mesmo que neguemos conscientemente, essas emoções e sentimentos não desaparecem, elas existem dentro de nós, mas agora escondidas de nossa percepção consciente.  


Inconscientemente, elas continuam a exercer influência e até se manifestar indiretamente através de comportamentos, pensamentos ou sintomas emocionais e físicos, sem que percebamos a conexão com o que estamos negando. 


É dessa maneira que sentimos na nossa pele, as consequências de termos “excluído” a alguém do nossos sistema. Através de problemas psicológicos, como ansiedade, depressão, baixa autoestima e dificuldades interpessoais, além de gerar doenças físicas, de todo tipo e tamanho.


Mas, resumidamente, o que é que nos diz a visão sistêmica sobre a exclusão?


A primeira lei do amor ou lei sistêmica de Bert Hellinger, é a lei de PERTENCIMENTO, que diz que todos, ao nascer, ganhamos um lugar dentro de um sistema e o direito absoluto e intransferível de pertencer a esse sistema


Mas, esta lei é transgredida quando por alguma razão, esse pertencimento não é reconhecido ou honrado por algum indivíduo do sistema. 


As particularidades do dia a dia e a falta de conhecimento sobre o fato de pertencer a um sistema familiar, nos levam muitas vezes a acreditar, que podemos deixar de reconhecer o pertencimento de pessoas que rejeitamos ou que mal consideramos, sem ter consequências. 


Pode acontecer, por exemplo, com alguém da família que faz coisas desprezíveis, por ser doente ou ter hábitos que nos produzem uma grande rejeição; por acreditar que estas pessoas agem de má fé ou possuem uma moral duvidosa, e, pelo tanto, por acreditarmos que são uma desonra para a nossa família. 


Nos transgredimos a lei de pertencimento negando o lugar de direito destas pessoas, inclusive nos sentindo bem; sentindo uma boa consciência, sentindo a consciência “tranquila” por seguir os critérios através dos quais nos identificamos com a família, e que pelo tanto, nos confirmam dentro da família e leais a ela. 


Existe uma necessidade pessoal de resolver determinadas situações, que obedece ao que chamamos de Consciência pessoal, que sempre está atenta a estarmos ou não agindo dentro das expetativas do nosso sistema, independentemente de estas ser certas ou erradas. 


Percebemos se estamos certos na sensação de inocência e de estarmos errados no sentimento de culpa, assim como através de outras autopercepções que respondem ás outras dois leis sistêmicas, de Ordem e de Equilíbrio.

 

Por outro lado, a Consciência familiar ou de grupo, exerce um controle ainda maior, pois é nela que agem as leis sistêmicas, trabalhando em um nível coletivo e mantendo a coesão, as características e a continuidade do sistema, pese a quem pese. 


Perante qualquer transgressão às leis sistêmicas, o sistema familiar, através da consciência de grupo, dará as condições para que aquelas transgressões sejam vistas e assumidas pelo indivíduo que as originou, ou então, sejam assumidas por outro integrante do sistema.


As dinâmicas relacionais em equilíbrio fortalecem ao grupo. Porém, sistema de crenças que acompanham as famílias através de gerações, que vão perdendo sua validez e diminuindo o poder de adaptação do sistema ao seu entorno, obriga a seus membros a agir através da compensação e do sacrifício, sempre a custas da enorme perda que supõe sair do seu lugar dentro do sistema. 


Assim, fora do seu lugar, sem noção de ordem nem de equilíbrio, alguns indivíduos chegam a acreditar que possuem a possibilidade, por exemplo, de sacrificar-se por “amor” e/ou lealdade, por outros membros do sistema, assumindo papeis e responsabilidades que não são os seus, e que por tanto, não têm como ser assumidos sem consequências de algum tipo. 


Estes conflitos ou emaranhamentos, possuem a potencialidade de minar a estrutura do grupo familiar, enfraquecendo as propriedades e características que definem o sistema.


Excluir alguém, não é mais que uma tentativa de nos manter incluídos, inocentes e amparados dentro dos parâmetros familiares, ou de assumir as “tarefas” que a consciência familiar designe. 


Como particularidade, podemos mencionar, que esta designação não obedece a critérios de justiça. Só obedece às necessidades sistêmicas do grupo familiar como um todo.


O que sucede, e que se confirma na prática das constelações, é que a cada ação, existe uma reação. Cada vez que há uma exclusão, surgem desde o sistema, dinâmicas pessoais e familiares para reconsiderar essa exclusão, que agem sobre quem exclui de ser possível, ou, de não o se-lo, sobre a sua descendência, pois alguém deverá olhar com respeito o pertencimento do excluído negado e devolver-lhe seu lugar de direito.

 

Ninguém deixa de pertencer, uma vez que o pertencimento se estabelece e isto acontece na concepção. Uma exclusão, é uma ferida aberta.


E a exclusão não acontece só na família. A exclusão provoca desequilíbrios também em outros sistemas de pertencimento, como nas empresas, associações e até em comunidades, etnias e até países, que sem reconhecer suas ações nem suas consequências, permanecem alastrando conflitos e desentendimentos. 


O exercício da não exclusão é sem dúvidas muito difícil..., e resulta muito mais difícil ainda, quando as pessoas não temos uma compreensão da nossa própria individualidade, quando não podemos sentir no nosso ser, o nosso pertencimento ao todo. 


.... Quando não percebemos a vida desde nossa existência espiritual, que de por si faz que todos sejamos iguais. 


A exclusão resulta ser um movimento humano impensado de autodefesa, que o indivíduo utiliza para se proteger da sua própria pequenez e das suas próprias limitações e incapacidades, sem perceber que em vez de fortalecê-lo, social e sistemicamente o enfraquecem. 


Vá contra todos os preceitos da teoria geral dos sistemas e é, na visão sistêmica, um ato de soberbia. 

A exclusão, é uma transgressão clássica e dramática à lei de PERTENCIMENTO, que sempre traz consequências negativas que levam a fragmentação e ao debilitamento dos indivíduos e do sistema do qual se trate.  



Muita luz a todos.

Um forte abraço

até!


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