A EDUCAÇÃO E A PEDAGOGIA SISTÊMICA 2. A educação e a família

 p. Daniel H. Della Valle Cauci

Pelo exposto, a educação não é a exclusiva formadora de cidadãos.

A família em equilíbrio, em tanto célula básica de qualquer organização social, pode oferecer cimentos fortes e apropriados para uma sociedade justa e sadia, que se complementa da ação educativa a favor dos princípios e definições que a própria sociedade determina para si mesma.

A sociedade e os governos devem propiciar a educação que se almeja, mas, uma família em desequilíbrio, incapaz de transmitir os valores universais primários a seus filhos, derruba qualquer instituição de ensino e qualquer tentativa de crescimento através da informação e da educação, até chegar a provocar a perda dos seus objetivos essenciais.

Um exemplo simples do que estamos falando aconteceu no parque infantil que está dentro do meu condomínio. Desde minha janela, observei um grupo de crianças brincar. Uma delas, tirou um brinquedo da mão de uma outra bem mais pequena, de uns 5 ou 6 anos, e esta ficou desconsolada. No parava de chorar.

A Mãe, constrangida e de longe, pedia para que parasse de chorar, sem êxito.

O pequeno dizia que era injusto... que ele estava brincando com aquele brinquedo primeiro e seguia chorando aos prantos. A mãe, severa e desconfortável, se acercou e pegando-o de um braço, ameaçou com ir embora para dentro de casa. E a criancinha, chorando desconsolada falou... “Minha professora nos ensina a compartir os brinquedos... ele tem que compartilhar!”.

A Mãe, nervosa pelo choro e os olhares dos outros pais, sem compreender nada do que realmente estava acontecendo, levou a criança embora, em prantos.

Uma única atitude, que pode marcar a uma criança através da frustração e a desproteção de uma mãe, que pode ser muito amorosa e dedicada, mas que, por um instante, não conseguiu se guiar pelas suas melhores qualidades.

O que é que fica como aprendizado... quais são as certezas, quais as dúvidas?

E... que é o que essa criancinha sentirá quando sua professora novamente fale de “compartilhar” na sua escola?

A criança, fica muitas vezes no meio de duas realidades que na prática não se tocam, não interagem, e, que ao mesmo tempo, lhe mostra e oferece dois marcos conceituais e de comportamento, que, por serem diferentes, confundem e se interpõem na sua capacidade de aprendizagem e de sociabilização. 

Sem que existam conceitualizações ou classificações rígidas, a ausência de laços familiares primários, e por tanto, a substituição de determinados estímulos por outros, aparentemente “equivalentes”, pode conduzir à falta de ferramentas emocionais, psicológicas e práticas para lidar com o processo de socialização.

Dentro desta compreensão, a família deve ser integrada a cosmovisão da educação, e ao mesmo tempo, é necessário compreender a plasticidade que a educação necessita, já que não existe a possibilidade de sermos unânimes à hora de defini-la como a melhor para a nossa sociedade. Mas, apesar desta falta de consenso, e pela importância que a educação possui, teríamos que observar que não é pela meritocracia nem pelo azar, nem pelo poder político ou financeiro que se exprimem do ser suas melhores qualidades, fundamentalmente no meio de uma sociedade que já não admite nem castas nem a polarização de classes, que historicamente se reproduzem em base à desigualdade e, pelo tanto, à injustiça.

Sistemicamente, estas castas e desigualdades possuem uma razão para existir, e não é por capricho ou rancor que devem ser extintas. Na realidade, deveriam ser naturalmente transformadas, pois são em si mesmas, uma enorme fonte de conflitos e de emaranhamentos que agem como verdadeiros tumores no seio da sociedade.

A pedagogia sistêmica traz uma solução para a integração da família e da escola. Para a conjugação natural da família e a educação, como a base da sociedade, como grande projeto de crescimento e evolução, assim como para a mancomunação de esforços em pró do educando.

Em base ao respeito das leis sistêmicas que foram trazidas por Bert Hellinger na ciência dos relacionamentos, nas Constelações Familiares Sistêmicas, a pedagogia sistêmica reordena os relacionamentos dentro da educação, através do fato de cada quem assumir seu lugar, agora dentro de uma grade de relacionamentos, que surge da percepção de um sistema que não estava sendo observado.

Isto, porque nem a criança, nem adulto, nem pessoa alguma é sozinha. Não existe separada do seu sistema em nenhum dos casos. E, no caso das crianças, jamais os pais podem ser desconsiderados ou professor algum pode ocupar, ainda que por algumas horas no dia, o lugar e o poder dos pais, ainda que tenha, aparentemente, melhores condições para fazê-lo. De ocorrer, traz ao sistema de relacionamentos uma transgressão sistêmica que debilitará e inviabilizará em algum momento do processo à educação.

Porém, é assim que acontece na prática.

E em meio de toda uma sequência de desequilíbrios, a criança é esquecida. A matéria prima do trabalho educativo se perde de vista.

Com sorte a família estará presente e, tanto os professores como as instituições de ensino trabalharão de forma construtiva e harmoniosa.

Mas o que se observa é que muitas vezes, seja porque os pais trabalham muito, porque possuem muitos filhos, por necessidades financeiras reais ou não, porque “carregam” suas próprias “cruzes” e traumas, por desinformação ou pelo motivo que for, não estão presentes para seus filhos, da forma em que para seus filhos seria essencial.

Em tanto que o bom professor, como ferramenta básica das instituições, se submete a políticas educacionais que em geral estão limitadas por falta de estrutura ou pelos direcionamentos político ideológicos das secretarias, se desdobra na tentativa de trabalhar e administrar a tempestade emocional dos seus alunos, para vencer as dificuldades próprias do processo de educar, tendo em todo caso que administrar, ao mesmo tempo, suas próprias dificuldades pessoais e familiares.

Na pedagogia sistêmica se estabelece o foco de atenção na criança e se lhe observa por completo, ou seja, como sendo parte do seu sistema.

A pedagoga e consteladora familiar Sra. Marianne Franke-Gricksch, primeira em articular a filosofia de Bert Hellinguer e a pedagogia, falou um dia para seus alunos:

“Eu sempre vejo vocês juntos com seus pais em nossa sala-de-aula. Para mim está claro que aqui não estão sentadas apenas 22 crianças, mas 22 famílias perante mim, portanto junto com pai e mãe são 66 pessoas, além de mim, dos meus filhos e o pai deles”. E tudo o que aconteceu depois desta revelação, até a comprovação por parte dos seus alunos da importância da força dos pais no processo de aprendizagem e nas suas vidas, só veio a melhorar o rendimento, as relações e a leveza dentro da sala de aula.

 

O LUGAR DA EDUCAÇÃO

A harmonização sistêmica do processo educativo traz inúmeras consequências positivas para a sua eficiência, mas, principalmente, permite que alunos, professores, instituições e famílias, adquiram uma visão muito mais abrangente da realidade, através da percepção de questões e princípios, que são essenciais para enfrentar a vida com êxito e com saúde, tendo condições de evitar, com novas ferramentas, a repetição de padrões arcaicos nos relacionamentos humanos.

Muita coisa deveria mudar no conceitual, de maneira ampla e desde os responsáveis pelas políticas educacionais, que inevitavelmente unem o que esperam como resultado do processo educativo com o financeiro. Isto fica evidente na macrovisão de que, o mais importante na sociedade é o aspecto econômico. E não digo que não tenha importância, mas submeter a educação... sei lá...

A dinâmica da sociedade em geral vai provocando os ajustes necessários mais urgentes na educação, sendo que esta deveria se antepor às necessidades de uma nação, para evitar aquela desfasagem, que deixa mais lenta a capacidade de resposta educacional aos desafios socioeconômicos.

Se fosse assim, os problemas e desafios que a educação enfrenta, possivelmente seriam mais fáceis de resolver.

Mesmo assim, a crítica e o julgamento do certo e do errado não faz parte das questões que aqui tratamos, fora de termos uma opinião pessoal sobre o assunto.

Acreditamos em um processo educacional na vanguarda, contínuo, intencional e sistemático de aquisição de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes que acontece durante toda a vida de um indivíduo; que não só se refere à transmissão de informação, e sim, a tudo o que melhora as aptidões e capacidades de interagir criativamente na realidade, incentivando a curiosidade, o pensamento crítico e a capacidade de resolver problemas, se adaptando e transformando positivamente o mundo em que vivemos.

Além disto, achamos que hoje, o processo educacional deveria resolver alguns absurdos históricos, como a desigualdade no acesso, a inclusão e a inter-relação das instituições de ensino com os outros sistemas aos quais o aluno pertence, sob o equívoco intransponível da exclusão de algumas das áreas fundamentais, através das quais este existe, como por exemplo a Família.

Mencionamos antes que a família é a primeira geradora de educação, e que existe uma via de mão dupla dentre as instituições de ensino e a família, que em geral, não está sendo trilhada. Tanto que esta desconexão é fonte constante de atritos e desencontros, que acabam afetando a multifacética constituição do processo educacional, que no seu aspecto mais íntimo, se estabelece dentre instituição, professor, aluno e família do aluno.

Outro aspecto que achamos importante deva ser tratado na construção de novos conceitos educacionais, é o referente à sustentabilidade, não só através da modificação de planos e métodos de ensino, se não que também, através de promover a conscientização e compreensão dos desafios ambientais, sociais e econômicos enfrentados pela sociedade.

Faz parte da sustentabilidade, buscar desenvolver uma mentalidade ecológica e responsável nos estudantes, com o objetivo de capacitar os alunos a entenderem e lidar com questões complexas relacionadas à conservação do meio ambiente, e isto inclui o aprendizado sobre justiça social, as mudanças climáticas, o uso de recursos naturais, e o incentivo às práticas sustentáveis tanto nas escolas, como no cotidiano e na vida familiar.

 

Um forte abraço

Até!

 

 

Comentários