INTRODUÇÃO À VISÃO SISTÊMICA DO PAI

 p. Daniel Héctor Della Valle Cauci

Introdução

Na minha tentativa de estudo e aprofundamento no tema Família, que se inicia no meu interesse por compreender melhor um caso em particular de relação Mãe/Filha, acabei por reunir algumas reflexões que apresentei aqui sobre o papel sistêmico da Mãe e dos filhos.

Hoje ofereço a quem tiver interesse, novas reflexões. Esta vez, para falarmos um pouco da figura paterna na visão sistêmica.

Ao Falarmos do Pai, falamos do masculino.

De um dos lados da dualidade primordial.

O aspecto Yang da união homem-mulher...

Falamos de uma das duas partes responsáveis pelo equilíbrio na base de todos os relacionamentos. Falamos de uma das duas partes responsáveis pela geração e continuidade da vida.

Por serem fundamentais para a vida, para a felicidade e o êxito, as relações que os filhos estabelecem com o Pai e com a Mãe, atingem o status de “tudo o que é o mais importante” …, mas também, quando nestas relações há conflitos ou desentendimentos sem resolver, acumulando magoas e desencontros, sem que exista ponderação, estes relacionamentos podem ser muito “conflituantes e dolorosos”.

Para os pais, para os filhos e para a família, e por tanto, para a sociedade.

Ao igual que a figura materna, sobre a qual já reflexionamos, o Pai, não é simplesmente o Pai; ele é um indivíduo original, produto de uma construção muito complexa.

O pai, ao igual que a mãe, e da mesma forma que mais tarde os filhos o serão, são a representação da vida em ação de cada sistema familiar de origem; são primeiramente o resultado da elaboração da experiência de viver de cada linhagem, e depois da sua própria experiência de viver, de cada influência genética, de cada marca epigenética, de cada escolha ancestral e das necessidades específicas da alma familiar da qual faz parte.

Ele por tanto possui uma história, e a sua história o constrói, mostrando uma forma de como resolver as experiências do dia a dia, até o momento exato em que junto a uma mulher, submergido nas ondas das energias da vida, ele mesmo gerará uma vida. E aí tudo muda.

Cada nascimento é uma explosão de luz, o surgimento de um campo de probabilidades, a possibilidade latente de expansão, de evolução, de experiências, e muito mais, e, na origem, está o Pai e Mãe, cada um com um manual de instruções e uma lista de tarefas para entregar a essa nova vida.

O pai, ao igual que a mãe, são uma ponte e fonte tão poderosa para os filhos no que refere à vida, que nem os pais nem os filhos percebem suas próprias naturezas na medida em que a vida está acontecendo. Só na percepção profunda do expandir da consciência isso irá a acontecer.

Até esse momento, progenitores “viajam” como passageiros descuidados da vida, e acreditando que, de alguma forma, estão ou deveriam estar no comando. Mas, ao perceber, ao superar os limites do evidente e começar a gatinhar numa consciência superior, a rede de relacionamentos e suas influências, sua história e suas escolhas, aquilo que são e suas circunstâncias, começam a fazer sentido.

Por este caminho, também podemos concluir, que as relações que os pais estabelecem desde um primeiro momento com os filhos, não são totalmente inéditas; se trata em realidade de relações velhas; é dizer, é inédita para esses pais e esse filho, mais são a continuidade de uma relação que chega ao presente através de incontáveis gerações e que vêm acotada por características herdadas, as que hoje dão forma à atual relação.

E nenhum destes vínculos irá a acontecer de forma desconexa ou caótica; não será independente das características pessoais dos participantes dessa relação, mas sim numa constante e atualizada interação dentre heranças, crenças, lealdades e tantas outras influências não materiais que estão presentes no sistema familiar e nas consciências pessoais do pai e dos filhos.

Na visão geral, a figura paterna cumpre um papel que muitas vezes podemos pensar que é substituível, pois na prática, nos encontramos com muitos casos em que o pai sai do seu papel e das suas responsabilidades, por abandono, separação ou simplesmente por não estar disposto. Se bem isto acontece também com a mãe, as estatísticas são claras, e mostram que o afastamento da figura paterna na família nuclear e muito maior e em geral, mais traumática.

Uma vez que nos dispomos a falar da figura paterna na visão sistêmica, estaremos falando de aquilo que se espera seja essa figura paterna em relação a sua esposa e em relação ao filho ou aos filhos desse casal. E isso é fácil..., Mas... a descrição utópica de um Pai não teria sentido na filosofia sistêmica, pois serviria só para comparações, que sabemos nos afastam das soluções que o sistema necessita.

No entanto, essa “falha” paterna, que muitas vezes consideramos que é de caráter, faz parte do dia a dia do sistêmico familiar, pois esse pai chega à nova família carregado de informações erradas, de crenças e sentimentos arcaicos e sem ter podido ocupar harmonicamente seu contexto, seu lugar e sem ter aprendido a sua hora, a interagir de forma efetiva e salutar com as pessoas do seu convívio.

Ao analisar o papel sistêmico da mãe, vimos que, o primeiro problema que enfrentávamos, era a “romantização da figura materna” ... sua idealização.

Quando observamos ao Pai, vamos a achar como um problema a resolver a aquela “falha” da qual falávamos antes. Esta “falha”, altamente traumatizante e que impede a percepção do Pai tal qual ele é realmente, junto a uma idealização arquetípica do que deveria ser ..., do que esperamos que o Pai seja, gera nos filhos e na família julgamentos que o excluem.

O pai, de alguma forma preso a sua história e a suas ideias limitantes, a sua cultura, aos ensinamentos que lhe asseguraram o pertencimento a sua própria família, de alguma forma dançando ao ritmo do que a sociedade propõe como normal e esperado para um “chefe” de família, dentro de claros padrões arcaicos, contribui na geração de “fraturas” nos relacionamentos familiares, especialmente com os filhos, ao impor a estes comportamentos enrijecidos ou inadequados como certos, ou sucumbindo ao peso da dor dos seus conflitos, procurando saídas que lhe aliviem e de alguma forma acabem com o sofrimento.

O pai, dentro de conceitos aceitos como intrínsecos pela sua consciência pessoal, e sem dúvidas não suficientemente revisados, assim como os filhos, na necessidade de conciliar seu próprio pertencimento através da sua própria consciência pessoal, entram muito comumente em conflitos, que provocam mágoas, “feridas” e traumas, que literalmente conseguem atravessar gerações, colocando às famílias em um looping de repetição de lealdades.

Ao observar a figura paterna, poderemos ver claramente o que chamamos “o problema do Pai”, que como dizemos, se trata de um comportamento herdado, antigo, que se exprime desde os primórdios da humanidade, quando o homem nada tinha a ver com a sua descendência, nem existia a figura paterna como tal…

Esse comportamento antigo evolui lentamente através de centenas de milhares de anos, chega ao patriarcado e se transforma, ainda muito divagar, na figura paterna atual, com uma pesadíssima herança de machismo e irracionalidade, que surge das mesmas funções que inicialmente lhe foram atribuídas pela tribo ou clã de outrora.

Entenda que não estamos procurando desculpas para as falhas dos Pais ...

Cada um de nós é responsável pelos seus atos e pelas consequências dos seus atos, e então, em algum momento deveria haver uma aceitação, um arrependimento e algum tipo de reparação. Mas os objetivos das CF não são de forma alguma a solução individual dos conflitos ou emaranhamentos e sim a solução coletiva dos entraves do sistema familiar, o que supõe uma transformação individual para um movimento espiritual coletivo. 

Continuarei a trazer reflexões sobre este tema, através da luz do conhecimento sistêmico familiar. Em novos artigos falaremos sobre a figura paterna na visão sistêmica, desenvolvento este tema inicial que é o “PROBLEMA DO PAI”, da sua evolução e da sua afirmação pelas expectativas criadas nos papéis que o homem exerceu ao longo da história, na idealização arquetípica e nos campos morfogênicos aos que pertence, para depois sim, continuar na reflexão do papel sistêmico do pai.


Muita luz a todos

um forte abraço


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