O PAPEL DA MÃE NA FAMILIA E EM RELAÇÃO AOS FILHOS

 p. DANIEL HÉCTOR DELLA VALLE CAUCI

A MÃE.

Qual será o papel da MÃE na visão sistêmica dentro da família e especialmente no relacionamento com os filhos?

---

Primeiramente, seja qual for o papel da MÃE, este se exercera a partir do ser único que ela é, e com as características únicas que ela possui, sendo que ela não existe primeiro como MÃE; e sim como uma pessoa comum, que nasce mãe junto ao nascimento do seu filho.

Esta forma de ver à MÃE, simples e objetiva, nos poupa do primeiro grande erro que cometemos ao perceber a MÃE de forma idealizada e irreal, o que nos conduziria, invariavelmente, a muitos outros erros assim como a perder de vista a pessoa que queremos observar e seu papel.

A MÃE é uma pessoa comum, com seu contexto familiar e social e com sua própria personalidade.

A Genética, que não responde mais que de soslaio às nossas perguntas, explica como a informação genética influencia nessa personalidade, através do que denomina “tendência genética”, que leva a parecermos (física ou comportamentalmente) com o pai ou com a mãe ou com alguém da família. Em tanto que na NOVA BIOLOGIA se pode ver que o meio ambiente, e, mais exatamente a “relação com o meio ambiente”, é o que é verdadeiramente determinante na formação da personalidade.

O certo é que para que essa mulher exerça seu papel de mãe, como ser, percorre um longo caminho de aprendizados e experiências, que vem desde sua história, dos seus ancestres, através do constante fluxo da vida do seu sistema familiar, e continua numa intensa dinâmica até o momento presente, não isenta de pautas e sistemas de crenças, de fidelidades e de culpas, provenientes de relacionamentos mal resolvidos e da influência cega das consciências grupais, segundo o seu pertencimento. E passa também por modificações corporais, hormonais, fisiológicas e emocionais a partir da sua própria experiencia e principalmente da sua história.

O principal, sino o único papel possível para a MÃE, é ser ela mesma, do jeito que ela é e pode ser. Ser mãe, estar mãe, se transformar em mãe, se confunde entre projetos e circunstâncias.

O filho até pode querer que a mãe seja tudo o que ele necessita, mas isto na realidade não passa de uma miragem ou de uma simples expressão de desejo infantil.

Temos um padrão morfogenético dentro do qual tendemos a permanecer, mas também estamos sujeitos a muitas mudanças e alterações pela influência do meio, e das inter-relações que estabelecemos. 

Dentro deste “marco” ou “circunstância sistêmica” tão particular, os roles ideais não tem lugar. E assim, o papel que se espera que desempenhe a MÃE, pode aproximar-se ou não daquele ideal que é o ARQUÉTIPO MATERNO.

Sendo que arquétipo é um conceito da psicologia utilizado para representar padrões de comportamento associados a um personagem ou papel social, serve como modelo ou padrão teórico que se estabelece como tal, por sua constante repetição através de gerações.

Quando esperamos da mãe um comportamento ideal assignado a priori pela estilização arquetípica, por um lado tiramos a essa mãe do seu contexto sistêmico, e por outro, trazemos à análise sistêmica as características positivas e negativas intrínsecas de todo arquétipo. Dois erros não admissíveis dentro da filosofia sistêmica.

A MÃE é a MÃE assim como ela é e não como queríamos ou gostaríamos que ela fosse.

Apesar de todo isto, é difícil de mais para qualquer filho ou filha, a percepção e o assentimento da imperfeição materna. O laço estabelecido com ela desde a concepção, o posterior laço afetivo e o pertencimento que se cria, seu papel fundamental na nossa sobrevivência, toda a informação familiar e social que me dita como ser e como agir em relação a MÃE e o que devo esperar dessa mãe, dentre outras muitas dinâmicas relacionais, assim como nossa própria condição indefesa, geram um vínculo de amor e lealdade, que completam o movimento à idealização, sem nos deixar, praticamente, outra escolha.

Como nos diz Bert Hellinger no livro “A simetria oculta do amor”:

“O apego amoroso que os filhos pequenos sentem pelos pais naturais é cego para o que estes fazem ou deixam de fazer. Os filhos agem como se o amor não pudesse tolerar nenhuma diferença; como se o fato de serem parecidos bastasse para ligá-los, e o de serem diferentes resultasse em separação ou perda. Suas ações testemunham o pensamento mágico infantil: “O igual atrai o igual”.

Na idealização, as expectativas e posteriormente as exigências, ficarão altas demais. Tão altas que serão difíceis de satisfazer por alguém que não é perfeito e que possui seus próprios “problemas” para resolver, ficando ainda mais complicado, quando os filhos olham à mãe desde uma postura ou atitude infantil.

Outra questão interessante, e talvez chave para a compreensão desta relação Mãe/filha, é a seguinte...

Fora das características positivas ou negativas da mãe e/ou dos filhos, o que realmente importa e a qualidade dessa relação; é aquilo que realmente determina se estamos bem ou não com a nossa mãe, e isso não depende meramente do certo nem do errado na nossa consciência pessoal.

Na realidade isso não depende de nada material, nem de nada que não seja percebido a nível espiritual, nos domínios de uma força superior que nos permite sentir a mãe (e ao pai) como a origem da nossa vida e porta de entrada de tudo o que nos chega desde o extenso campo familiar e da vida.

É o que chamamos “tomar a mãe” … “tomar o pai” …

Agora..., podemos enumerar uma longa lista de atributos maravilhosos com os que Carl Jung descreve a “Grande mãe” ou ARQUÉTIPO MATERNO. Quase que os mesmos que qualquer um de nós recitaria se nos fosse solicitado: Amor, grandeza, bondade, proteção, sustento, fertilidade etc.

Isto porque o ser humano, gosta de finais felizes… porque na realidade, o próprio Carl Jung incluía como atributos do arquétipo materno, tanto características positivas como negativas, e até... nefastas.

Mas, na visão sistêmica, onde a procura de soluções passa pela reintegração dos excluídos e pela compreensão profunda das causas e dinâmicas dos conflitos, por definição, não existe espaço para julgamentos nem condenações.

Mais uma vez AFIRMAMOS: a MÃE é como ela é; com virtudes e defeitos. Esse é o nosso ponto de partida para descrever o papel da mãe como mãe, e especificamente na relação com seus filhos.

Sobre isto, no livro “um lugar para os excluídos”, Bert Hellinger diz:

“Honro as mães a partir de uma compreensão filosófica. Contemplo o que significa ser mãe. Todas as mães realizaram o decisivo de uma forma perfeita. Não existe nenhuma mulher que se tenha tomado mãe e não o tenha realizado plenamente. Caso contrário, não se teria tomado mãe. Portanto, no que é decisivo, todas elas são perfeitas. Aquilo que vem depois tem um papel secundário.”

Podemos decifrar a importância do papel da mãe nos seus efeitos e pelas suas consequências, quando os observamos dinamicamente, dentro do sistema familiar.

Na prática, a experiência das Constelações mostra a energia que a mãe representa, quando a mãe e os filhos estão nos seus lugares, sem transgredir as leis sistêmicas… Daí que dentro da teoria da Filosofia de Bert Hellinger, a Mãe possui um enorme protagonismo.

Por ser geradora, pelo seu lugar estratégico na vida familiar, por obtermos a vida do seu próprio corpo numa relação intensa de absoluta dependência, pela amamentação quando possível e seus efeitos...pela transcendência de ser o portal desde donde a vida continua. Tudo isto e mais, é muito importante.

Mas, todas as teorias que nos falam sobre o vínculo com a mãe, agem dentro do espaço físico, emocional e energético, de uma forma que não é bem compreendida nem pode ser bem detalhada. É uma relação que pode ser ao mesmo tempo mágica, conflitiva e sobretudo... misteriosa, pela sua força e por lindar tanto com meta-emoções como com conceitos como os de vida e morte.

E é misteriosa, porque dentro da sua plenitude ou decadência, a relação mãe /filho ou filha sempre é determinante na forma em que experimentaremos a vida, e a capacidade que teremos de alcançar o êxito ou fracasso.

Existe por trás desse relacionamento um simbolismo inegável. Tanto mãe como pai, simbolizam a vida, pois sem eles não a teríamos, e nossa atitude perante a vida, poderá ser efetiva e luminosa ou pesada e frustrante, em sintonia como nível de equilíbrio que a relação com eles tenha alcançado. Porém, o vínculo materno e o vínculo paterno irão se expressar simbolicamente de forma diferente.

Estes vínculos são tão fortes que ainda que os filhos cresçam longe desses pais, continuarão influenciando e agindo sobre eles e sobre a forma em que eles se relacionam com a vida.

Para ter uma pequena amostra da importância da mãe na filosofia sistêmica, o Sr. Bert Hellinger, criador desta filosofia de vida, nos diz:

“Vou compartilhar o segredo de como eu constelo. Sempre faço só uma constelação. Nela todo o essencial, o decisivo, sai à luz. Um Constelador deve de ter claro que: "A felicidade se logra quando primeiro se vai até a mãe.

Qualquer obstáculo no fluir do vínculo com a mãe, por menor que este seja, qualquer crítica ou reclamo que se apresente sem assentimento e respeito, será também um obstáculo para nos relacionar com a vida de forma exitosa, efetiva e feliz.

Recebendo a mãe de braços a abertos, recebemos a vida de braços abertos.

Esta frase pequena, possui um alcance e significado imenso e determinante para poder compreender o êxito ou fracasso que teremos em todos os níveis de relacionamento, sejam estes afetivos, socio-profissionais ou familiares.

E os efeitos da correlação relacionamento mãe/filho ou filha – êxito/fracasso na vida dos filhos, se expressaram tanto comportamental, emocional como fisiologicamente, em desequilíbrios funcionais e/ou processos patológicos de qualquer índole.

Podemos descobrir a importância desses vínculos e a forma em que nos condiciona ao compreender os 5 círculos do amor.

Um mal relacionamento ou relacionamento disfuncional, aquele onde mãe e/ou filhos estão fora dos lugares pautados pelas leis sistêmicas, ou onde agem desde uma postura infantil, dificultará e enfraquecerá a forma em que estes se relacionarão com a vida, impedindo o sucesso e deixando o fato de viver, minimamente pesado e vazio...

Pelo contrário, um relacionamento equilibrado com a mãe nos abre as portas da alma. Uma maior consciência desse relacionamento profundo assim como sua harmonização, nos eleva a uma consciência espiritual e contribui para nos colocar dento de um campo infinito de probabilidades, um campo quântico, onde deixamos de lutar ou negociar com a vida para nós integrar a ela.

É verdade que a relação direta que existe entre a mãe e o sucesso ou fracasso na vida dos filhos, é difícil de compreender ou até de aceitar para muitas pessoas que não compartilham a visão sistêmica. Mas, outra vez devemos chamar a atenção ao fato de que nesta filosofia a gente não tenta explicar por que as coisas acontecem, e sim compreendê-las na medida em que elas existem.

A relação Mãe/filhos é muito dinâmica e depende de muitos fatores e a única possibilidade que temos de compreendê-la, e através de uma revisão do conhecimento teórico-prático já adquirido e, no nosso caso, observando seus efeitos na vida dos participantes dessa relação, e seus longos e duradouros efeitos e consequências no campo familiar.

As qualidades que podemos atribuir à figura Materna, são inúmeras, românticas e intrínsecas numa visão ideal da Mãe.

Os conflitos e reclamos nos quais os filhos muitas vezes se fixam, conflitos e reclamos que são dramáticos e tremendamente dolorosos para estes filhos, não se explicam nem se superam tendo como axiomas a figura ideal e arquetípica da Mãe, ainda que partamos da base de que os filhos também respondam ao ideal arquetípico de FILHO.

A resolução não é possível porque simplesmente estes axiomas não são verdadeiros; não são reais.

Olhando desde os filhos, qualquer solução verdadeira dos conflitos e reclamos, passa pelo assentimento dessa realidade específica que é a nossa única e possível relação existente com a nossa mãe. Com essa mãe real, com suas características únicas e intransferíveis; com essa mãe de carne e osso que traz em se, todo o peso do seu próprio sistema familiar e as escolhas que fez na sua vida, até se tornar a única, e por tanto, a melhor mãe que poderíamos ter.

 

Mas... O que fazer quando a convivência MÃE/FILHO ou FILHA é difícil?

Quem tem a responsabilidade de “salvar” ou de “reparar” esse relacionamento?

Como é que a MÃE continua a ser MÃE quando não está no papel nem no lugar da MÃE que nós necessitamos, e, pelo tanto, lhe assignamos?!

Qualquer tentativa de resposta para estas e muitas outras perguntas deixa “cabos soltos” e corações inquietos, apesar de que, respostas existam.

 

Tudo isto é muito difícil de compreender e por tanto de aceitar...

O filho diz...

Como é?!

Como conviver com a dor e a angústia de um relacionamento disfuncional?

Como aliviar a tristeza e a enorme carência que aperta o coração!?

Porque isto acontece comigo!?

 

E é absolutamente compreensível.

Todavia, e como falamos, a solução dos conflitos e reclamos passa pelo assentimento dessa mãe e dessa relação, mas, ainda não é essa a solução a todo esse conflito.

Esse é só o começo do movimento da solução. Um começo e uma condição para a cura.

Podemos dizer que é o primeiro passo. E depois desse passo, cada caso é um caso e nem sempre, com finais felizes, daqueles que imaginamos com um céu Cor de rosa.

Os movimentos de solução são lentos dentro dos relacionamentos, e ainda mais lentos quando são trazidos pela MÃE ou pelos FILHOS desde o campo familiar de forma inconsciente.

 Mas, mesmo assim, não é nada com o que o nosso “adulto” não possa lidar, através de um viver sistêmico, mantendo o essencial, bem na frente dos nossos olhos, e valorizando a vida como o bem mais precioso.

 


Comentários