UM OLHAR SISTÊMICO SOBRE A DOR DO SÍNDROME DO NINHO VAZIO

 p. Daniel H. Della Valle Cauci

 

E que sucede quando os filhos crescem e se transformam em adultos?

Bom.... Nada de especial! Na realidade... se cumpre o ciclo da vida...

Independentemente de como se defina a vida para nós, seres humanos, a vivenciamos como uma sucessão de gerações. Por termos um organismo finito, nascemos, crescemos, nós desenvolvemos, entramos na senescência e, em algum momento viremos a morrer, sendo que muitos de nós, no transcurso da vida, gestaremos novas vidas, os descendentes, os filhos, que conformaram as novas gerações. E assim sucessivamente.

Então, nascer e crescer é normal.

Na moderna e totalmente aceita visão sistêmica da sociedade, a estrutura base da família é pai, mãe e filhos, existindo depois o que se denomina família estendida, onde se somam avôs, tios, sogros, noras e genros, sobrinhos, etc.

Sociologicamente, pode se classificar a população em faixas etárias, fundamentalmente com fins de estudo estatístico. Mas, na visão sistêmica familiar, e como um simples ponto de partida, se definem 4 etapas ou estações: infância e adolescência, adulto jovem, adulto casado ou em união estável e adulto com filhos.  Estes quatro grupos supõem etapas onde as leis sistêmicas se aplicam de forma diferenciada a cada uma delas, jamais uniforme, em relação à ordem, precedência, prioridade e ao fato de como e quanto dar e/ou receber.

Nada disto é fixo nem procura uniformizar os relacionamentos. Não deve se confundir, como acontece, com estruturas rígidas ou dogmáticas, tanto assim, que cada caso é diferente do outro. Tanto as leis sistêmicas como as outras apreciações servem como parâmetros de diagnóstico a partir da sua aplicabilidade e da sua repetição em milhares (melhor milhões) de casos estudados.

Acontece que para alguns de nós, para a maioria em realidade, depois da infância e da adolescência, depois de sermos adultos, depois da etapa do matrimonio ou da união estável, chega a etapa de sermos pais, o momento da maternidade e da paternidade. E ela chega, em quaisquer dos casos... Sem manual de uso.

Chegar a ser pai o mãe não pode ser descrito. E nem vou tentar uma definição.

É maravilhoso e assustador. Mas sem dúvidas é um divisor de águas na vida de qualquer pessoa.

A criança nasce em simbiose com a mãe e o pai moderno assume seu papel estratégico. Aos poucos o pai aparece na vida do filho, entanto que ambos cuidam e se dispõem a dar sustento, educação, amor, proteção, e tudo o que esse ser maravilhoso necessite para crescer, ser uma boa pessoa, independente e cheio de vida.

A criança cresce, e vai sendo conduzida pelos pais, se socializa, vai formando sua personalidade, sempre sob do olhar amoroso e condutor dos pais.

Entre tanto, ...a vida dos pais gira em torno desse filho e, aos poucos, deixam de viver parte das suas vidas para ser parte da vida desse filho, pois sem os pais, sem dúvidas esse filho teria drasticamente diminuída a possibilidade de êxito na vida, e até quem sabe, a possibilidade de sobrevivência.

Mas, há um momento da vida familiar, quando o filho já cresceu, inteligente e capaz -como os pais queriam-, onde o danado quer... se independizar. E com razão!

O filho, agora esse novo adulto, necessita espaço, pois há muitas exigências e situações que deve resolver para conduzir sua vida; para contribuir com o fluir da vida, e as suas soluções passam por decisões e escolhas que não incluem necessariamente a aprovação plena dos pais...  trabalho, estudo, namoro, tempo para suas amizades e o lazer, espaço para seu novo ritmo de vida...

Porém, para aos pais, resulta muito difícil ter que renunciar ao controle por amor; a fazer parte ativa em todas essas circunstâncias que definem o futuro de esse ser... ser que tanto se ama.

Sempre sem manual, os pais improvisam, se adaptam ou não, inventam, chantageiam, e tentam as mais diversas estratégias para permanecer no controle. Sistemicamente se trata de ajustes que deveriam ser fáceis e lógicos, mas, a consciência pessoal gera forças suficientes como para provocar sensações de obrigatoriedade ou de culpa, sensações nos filhos de estar devendo aos pais a vida que recebeu deles, ou nos pais, a sensação de poder cobrar dos filhos a vida e os sacrifícios que por ele foram feitos, o que pode empoderar os desejos, por vezes errados dos pais, e que assustam, oprimem ou debilitam ao novo adulto que necessita muito da força e apoio dos seus pais para dar cause a sua vida.

Se chega assim ao que se conhece como “Síndrome do ninho vazio”.

Observe que do relato anterior se desprende que nascer, crescer, formar uma nova família e dar curso a tudo o que a vida nos trará, é lógico e saudável!

Então… Onde é que está o problema que dá origem a este síndrome… a esta crise que traz aos pais tristeza, solidão, ansiedade e até depressão?

Uma tentativa de explicar tudo isso, é que essas crises existem por amor, por grandes apegos, porque os filhos são a vida da gente ou até porque estamos seguros que, se “ajudamos”, a vida deles será melhor... Na realidade essas são as razões que nos damos quando já estamos na crise, ou quando somos muito complacentes com quem está nessa crise.

Na ciência dos relacionamentos, como Bert Hellinger nomeou a sua filosofia, se compreendem estas circunstâncias emocionais como emaranhamentos que surgem por perder de vista o obvio. Nas Constelações Familiares o que interessa não é explicar porque as coisas acontecem e sim procurar soluções. Soluções que chamamos de sistêmicas, pois devem ser soluções que contemplem a todos dentro do sistema familiar.

Assim, independentemente das circunstâncias particulares da família em questão, econômicas, sociais, matrimoniais, culturais etc, existem parâmetros organizativos que permitem uma observação objetiva e científica de cada sistema quando funcional, e por tanto, também na disfuncionalidade.

Poderíamos dizer que para a vida fluir sem grandes contratempos os relacionamentos deveriam ser assim ou assado… Mas, não é exatamente isso o que diz a visão sistêmica. A vida de relacionamentos é complexa… e como não se tenta explicar a origem dos conflitos e sim procurar fenomenologicamente as soluções, não podemos de jeito nenhum dizer que há que agir de uma determinada forma para agir corretamente, nem o contrário. O que dizemos é que se agiu como era possível. E uma vez que nos é possível observar e assentir com tudo como foi e como é, nos concentremos em transformar e modificar aquilo que pode ser transformado ou modificado como para que todas as partes possam se re harmonizar e continuar a vida, cada quem assumindo seu papel e suas responsabilidades em um claro esforço de não gerar outras consequências negativas.

A sensação de vazio que deixam os filhos nos pais ao sair de casa, ao se independizar de forma saudável, não é outra coisa que um chamado de alerta para os pais. Um alerta que avisa sobre algo que está fora de lugar e que estressa e prejudica o relacionamento com os filhos e aos próprios filhos. E o que está fora de lugar é que para a vida fluir, cada um de nós deve estar no seu lugar de ordem e de equilíbrio.

Três leis.

Só três grandes e simples leis sistêmicas nos ajudam a ressignificar toda essa dor e essa solidão:

Primeira lei: PERTENCIMENTO. Desde o nascimento temos direito impostergável a pertencer. A vida é minha e só posso agir nela desde meu lugar. Reter os filhos ou lhes impedir dar curso a suas vidas, é de certa forma lhes negar seu pertencimento.

Segunda lei: ORDEM: em tanto pequenos, os filhos têm prioridade e são colocados em primeiro lugar. Quando crescem e formam uma nova família, os pais têm precedência, mas a nova família tem prioridade e deve ser respeitada por todos.

Terceira lei: EQUILÍBRIO: Uma lei que é de ouro e, não entanto, tão difícil de compreender… Cada tipo de relacionamento possui uma aplicação diferente desta lei. Mas, falando da relação dos pais com os filhos, a relação de dar e receber em equilíbrio, no gera especificamente devedores ou credores, pois ela só tem uma via. Os Pais só dão e os Filhos só recebem. Os filhos só devolvem de alguma forma o que receberam dos pais, na doação a seus próprios filhos, da mesma forma que seus pais fizeram com eles, ou, fazendo algo bom das suas vidas. Pretender devolver a vida que os pais nos deram, os cuidados e cada expressão de amor e dedicação, seria pretender pagar uma dívida impagável. Mesmo quando não houve amor ou cuidados.

Lhes arrogar aos filhos a tarefa de ter que sacrifica algo das suas vidas que seja irrecuperável é tirar-lhes sua força e lhes resultará pesado de mais.

Cada Pai, cada Mãe, cada filho é uma edificação com as suas próprias características, e no grupo familiar, grupo que em geral se forma por afinidade, as características se toleram, se extirpam, se adaptam ou se transformam seguindo parâmetros únicos e próprios, pois a viabilidade do sistema dependerá da harmonização dos relacionamentos tendo em conta as necessidades do grupo. Por tanto não existem soluções mágicas. Existem soluções, onde cada quem percebe o que está em desordem, toma consciência, ressignifica, assente, se dispõe e transforma.

A síndrome de ninho vazio é uma desordem afetiva de aqueles pais que não assumem seu estado adulto, e por tanto não assumem totalmente suas vidas nem suas responsabilidades.

São muitas as circunstâncias que levam a síndrome de ninho vazio, muitas as variáveis que a modificam e a caracterizam.

Agora… O crescimento e a independização dos filhos é o normal.

 

muita luz a todos,

um forte abraço

 

até


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