p. Daniel H. Della Valle Cauci
Estar só não é o mesmo que sentir-se em solidão.
Estar só se refere a não estar acompanhado de outras pessoas
no momento. É algo passageiro, ainda que se possa aplicar a um estado concreto
ou abstrato. Mas estar só não necessariamente gerará desconfortos ou
desequilíbrios. Se o faz, é porque há problemas.
Já a solidão, sentir-se ou estar em solidão, é um estado
emocional o qual uma pessoa se sente isolada e desconectada dos outros, mesmo
que esteja rodeada por outras pessoas.
Assim, a solidão é um estado de ânimo. É um sentimento. Se
pode dizer que é um estado de espírito.
No entanto, nem sempre esta diferença fica clara para quem
está em solidão ou se sente sozinho. Segundo seja a condição emocional do
indivíduo, estar circunstancialmente só, pode agravar a situação de quem se
sente em solidão e extremar seus sentimentos.
Esta confusão determina que falar, sobre solidão e sobre o
estar só, pode ser um desafio interessante, pois envolve abordar conceitos
básicos, assim como conceitos psicológicos complexos, potencializados pelas
interações e pelo também complexo comportamento humano.
Muitas vezes necessitamos estar só. Geralmente por um curto ou relativamente curto período de tempo. Mas a realidade diz que necessitamos das outras pessoas para completarmos e nos sentir bem. Somos seres sociáveis que se nutrem da inter-relação familiar e social, edificando-nos com os aportes que recebemos consciente e inconscientemente das pessoas e do meio; fundamentalmente de todos e cada um dos desafios. Nós construímos a partir dos aportes positivos e negativos que a vida nos oferece, da mesma forma e na mesma intensidade.
O ser humano até pode decidir por uma vida em isolamento,
mas só depois de um longo período de aprendizagem e treinamento, assim como de
um autoconhecimento que de sustento a sua personalidade e ferramentas
intelectuais como para discernir corretamente em todo momento, em tanto dura
essa empreitada. Qualquer outra forma de experimentar uma vida em isolamento
humano, trará consequências.
O fato de mantermos uma vida em contato com outras pessoas,
não só é determinante no que refere à evolução social, ao fato de manter
características comportamentais humanas, ao acúmulo de conhecimento, ao
desenvolvimento de habilidades e de atingir melhores condições de vida, ao fato
de se adaptar ao médio e a outras questões obvias que a vida em sociedade
potencializa... As dificuldades que surgem da vida isolada absoluta, sem
contato humano, afetam todas as formas existenciais do indivíduo. Pessoas que
circunstancialmente crescem em isolamento (que são casos isolados, mas registrados),
perdem a fala, a capacidade de aprendizagem, o andar bípede, perdem a empatia e
em geral a amplitude do leque de respostas emocionais etc. ** fotos de casos de crianças...
Fora da sensação de solidão, que poderia já anunciar uma
condição de desequilíbrio, o fato de viver isolados ou nos sentindo sós,
modifica a percepção da realidade de forma contundente, o que determina a forma
em que nos adaptamos à mesma.
Bem, estar só, como já dizemos, é um fato específico e
transitório. Pode fazer parte de um estado emocional ou espiritual, mas
basicamente se trata de não ter ninguém por perto. Curiosamente e como já
dizemos, estar só, não remete à ideia de ter que se sentir só. O silêncio, a
natureza e outras formas de “acompanhar” a escolha de estarmos sós, contribuem
e até são essenciais em determinados momentos da vida, como acontece na
introspecção, na tarefa de nos autoconhecer, na criatividade, na reestruturação
pessoal etc. Mesmo assim, nada disto seria possível estando só e ao mesmo tempo
imbuídos em sentimentos de solidão.
A solidão pela sua vez, em tanto sentimento que é
desagradável ou doloroso, em geral acompanha momentos de angústia, de
depressão, de grande ansiedade e de tristeza, no luto, nas separações e em
outras circunstâncias, onde, de uma forma ou outra, sempre achamos presentes,
até como protagonistas, o apego, as emoções e as consequências destas duas não
virtudes.
A solidão permanece mais tempo
em nós, é resulta mais profunda e duradoura quando possui sua etiologia nos
primeiros anos de vida.
No sentido sistêmico, estar em
solidão não se refere apenas à condição de não estar acompanhado por outras
pessoas, mas também pode se referir à experiência de não se sentir conectado a
um sistema maior, como a uma comunidade, a uma cultura ou a uma família. Nesse
sentido, a solidão ganha um significado muito mais amplo e profundo, pois sua
existência supõe transgressões às leis e regras da teoria sistêmica, que
influenciarão, nem sempre positivamente, nas dinâmicas dos inter-relacionamentos.
O pertencimento, por exemplo,
que nos diz que ao nascer já pertencemos a um grupo, a uma estrutura maior que
nós, é uma lei intransgressível na concepção sistêmica. Não fazer parte de
nenhum grupo (ser só), é um conceito utópico.
Dentro da visão sistêmica, estar
só é circunstancial e uma opção, mas sentir solidão já é um desequilíbrio que
anuncia uma história, uma origem dentro desse sistema. Não se fala aqui da
possibilidade de um indivíduo ser mais ou menos feliz ou mais ou menos triste e
sim de que a sua condição de desequilíbrio, poderá afetar a todo seu sistema
familiar ou social no qual está inserido, de diversas formas e com diversas
consequências.
Por exemplo, uma pessoa pode ter
muitos amigos e familiares, mas, ainda assim, se sentir sozinha e desconectada
de sua comunidade, sem que existam para isto razões evidentes. Neste caso, elas
existem e são sistêmicas, o que, por definição, afetarão a todo o sistema.
E ainda mais.
Na observação sistêmica da
sociedade, e por tanto dos indivíduos que a formam, tudo acontece em relação
direta com os relacionamentos que entre estes se estabelecem.
Dentre as bases teóricas da
visão sistêmica, estão a Teoria da comunicação, que enfatiza a comunicação como
base dos relacionamentos e do intercambio das informações necessárias para que
a sociedade exista, e o Análises Transacional, que afirma que todo contato
humano se traduz em uma transação, uma negociação ou uma conciliação, em tanto
que todo contato se estabelece através de algum tipo de comunicação.
A vida em solidão absoluta,
fecha a possibilidade de que a sociedade exista e assim, o ser existirá
humanamente quando isolado, em tanto este guarde e preserve suas
características humanas. Pelo mesmo caminho, alguém que se sente em solidão
fecha ou desnaturaliza os canais de comunicação com as pessoas a sua volta, sem
poder satisfazer uma das suas necessidades sutis mais importantes, segundo
Berne, criador do Análises Transacional, que é “a fome de Afagos e de
reconhecimentos”, ou seja, a necessidade de afeto e amor. Neste caso não pode
preservar aquilo que só pode obter de fora de si mesmo.
O ponto é que confundimos
palavras e significados e justificamos e até manipulamos segundo as nossas
necessidades, estados emocionais como a tristeza, a depressão ou a ansiedade,
por não termos defesa ante sistemas de crenças e emoções arquetípicas arcaicas
como o apego e o medo. Também, muitas vezes transformamos o fato de estarmos
sós, circunstancialmente, em um estado de solidão permanente fora da realidade.
Assim acontece no “síndrome de ninho vazio”, nos estados de carência afetiva,
na intransigência de querermos as pessoas do jeito que “deveriam ser”, segundo
o nosso ponto de vista, e em muitas outras circunstancias.
Se estamos só, e o sentimos como
um desconforto, como algo que deve ser resolvido, isso tem uma solução
relativamente fácil, pois salvo excepções pontuais, estamos rodeados de pessoas
e de possibilidades de contatos humanos. Se trata em este caso de assumir o
nosso poder de adaptação, que como adultos temos e devemos exercer.
Sentirmos em solidão, como um
estado do “ser”; emocional e profundamente afetados, deixa de ser um momento
passageiro e passa a ser uma circunstância sistêmica, que exige de nós uma
outra atitude bem mais dedicada e consciente: nos deter, observar, perceber e
ressignificar, para nos adaptar ou transformar aquilo que está em desordem ou
em desequilíbrio.
Geralmente este processo
consiste em perceber alguma circunstância que está se repetindo na nossa
família desde algumas gerações atrás, observá-la, compreendê-la e transformá-la,
pois ela se repete na submissão a sistemas de crenças arcaicos, baseados em
apegos e expectativas que já vem evoluindo sobre desordens e desequilíbrios
antigos.
Resumindo:
Se está só, procure, pois, as
soluções para isso estão ao seu redor.
Se é solidão o que está
sentindo, é porque há circunstâncias sem resolver na sua vida, circunstâncias
que esperam por solução, e para isso, para poder resolvê-las, pode ser que
tenha que “abrir mão” de algumas ideias limitantes e aumentar sua
“plasticidade”.
Em bom português... terá que
mudar!
De todas as formas, o resultado
será muito satisfatório.
Muita luz a todos
Um forte abraço
até
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